Geoquímica Isotópica da Diferenciação Planetária

ILUSTRAÇÃO DA ACREÇÃO DE UM PLANETA

O modelo de formação dos sistemas planetários está baseado em teorias de mecânica celeste e observações astronômicas. O processo astrofísico mais comum no Universo é a formação de estrelas. A formação de uma estrela é controlada pela força da gravidade. Gigantescas porções de gás e poeira cósmica na Galáxia possuem regiões mais densas e frias onde é possível formarem-se moléculas espontaneamente. Estas regiões de nebulosas são chamadas de nuvens moleculares, que são geralmente opacas à luz visível. Essa opacidade se dá pela presença de grande quantidade de poeira cósmica, partículas do meio interestelar concentradas de várias eras de estrelas anteriores que enriqueceram essas grandes nuvens com elementos químicos mais pesados que o hidrogênio e o hélio.

A poeira cósmica consiste de pequenos grãos de silicatos, carbetos, nitretos, grafita e diamantes que foram ejetados por explosões de supernova e por ejeção de massa de atmosferas de estrelas supergigantes, as chamadas estrelas AGB (Assymptotic Giant Branch stars). Outra porção da poeira cósmica consiste de partículas de gelos principalmente de água, dióxido de carbono, monóxido de carbono e amônia. Nas baixas temperaturas do espaço interestelar esses compostos todos estão no estado sólido e servem de núcleos de formação de moléculas mais complexas tais como cianeto de hidrogênio, formaldeído, metano, etc. Estas nuvens são majoritariamente compostas de hidrogênio molecular devido às condições de baixa incidência de radiação ultravioleta no interior opaco e denso das nuvens moleculares onde moléculas de hidrogênio se formam e suas ligações químicas não são prontamente rompidas. Os cometas são relíquias de planetesimais que preservam a composição original da nebulosa solar e guardam grande parte desses gelos e compostos orgânicos.

NÚCLEO DO COMETA HALLEY EJETANDO VOLÁTEIS, FOTOGRAFADO PELA SONDA GIOTTO NA DÉCADA DE 90. OS COMETAS SÃO PLANETESIMAIS QUE PRESERVAM OS GELOS E COMPOSTOS ORGÂNICOS DA NEBULOSA SOLAR.

Grandes porções de nuvens moleculares são densas e frias o suficiente para permitir que a gravidade devido à massa da própria nebulosa lentamente inicie o processo de colapso lento e gradual no começo e depois mais rápido e eficaz no final do processo. Várias porções de uma nuvem densa formam nódulos de gás e poeira cada vez mais densos. Cada nóbulo formará uma nova estrela, e cada estrela desta terá uma quantidade considerável de poeira que se distribuirá em discos protoplanetários ao redor das protoestrelas. Estes discos serão os locais onde novos planetas vão se formar. Análises de isótopos de oxigênio estáveis (O-16, O-17 e O-18) de meteoritos, rochas lunares e terrestres revelam uma gama de diferentes processos de aglutinação de material planetesimal e posterior processamento de materiais planetários. Por exemplo, os condritos carbonáceos primitivos (CI e CM) representam planetesimais processados por alteração aquosa da fusão de gelo de água em regiões mais distantes do proto-sol. Regiões estas mais próximas da região de coalescência dos planetas gigantes gasosos, na chamada linha de congelamento do Sistema Solar, onde a água existe apenas no estado sólido. Nesta região mais densa e fria do disco protoplanetário as razões isotópicas de oxigênio são completamente diferentes das razões isotópicas de meteoritos que se formaram mais próximos do proto-sol. O gráfico que mostra a relação entre os isótopos estáveis de oxigênio revela diferentes regiões da nebulosa solar, ou do disco protoplanetário, onde os meteoritos se formaram. Estes representam heterogeneidades no reservatório geoquímico da nebulosa solar, ou seja, diferentes regiões com propriedades físico-químicas distintas. No geral se considera que a nebulosa solar é isotopicamente homogênea. No entanto, em escala de materiais asteroidais revela-se regiões estratificadas com correlação da distância em que os corpos sólidos coalesceram em relação ao Sol. 

GRÁFICO DE ISÓTOPOS ESTÁVEIS DE OXIGÊNIO REVELANDO DIVERSOS PROCESSOS DE FRACIONAMENTO ISOTÓPICO QUE OCORRERAM EM PORÇÕES DISTINTAS DA NEBULOSA SOLAR GERANDO DIFERENTES RESERVATÓRIOS GEOQUÍMICOS TAIS COMO O SISTEMA TERRA-LUA, MARTE, OS CONDRITOS CARBONÁCEOS, OS CONDRITOS ORDINÁRIOS, ETC.

Os isótopos são átomos do mesmo elemento químico, mas que possuem diferentes números de massa atômica, ou seja, representam átomos cujos núcleos possuem o mesmo número de prótons, mas diferentes números de nêutrons. Todos os isótopos de um mesmo elemento têm as mesmas propriedades químicas e físicas, mas existem diferenças sutis causadas pela diferença de massa entre eles. Por exemplo, o oxigênio-16, o mais abundante isótopo do oxigênio, é mais leve que os demais isótopos, oxigênio-17 e oxigênio-18. Sendo assim, as moléculas de água contendo O-16 serão mais leves que moléculas de água contendo O-18, as interações químicas entre um átomo de O-16 e um átomo de hidrogênio em uma molécula de água terão uma cinética ligeiramente diferente de uma mesma ligação química entre O-18 e um átomo de hidrogênio. O O-18 terá uma vibração intrínseca na ligação covalente mais lenta do que um átomo de O-16 e estas diferenças favorecem um fracionamento entre moléculas de água com diferentes conteúdos isotópicos. Num processo de evaporação da água, moléculas contendo O-18 passarão mais lentamente para o estado gasoso em relação a moléculas contendo O-16. Assim, num processo de evaporação lenta cria-se um reservatório de água líquida levemente rica em O-18 e o vapor produzido estará levemente rico em O-16. Quando as primeiras chuvas ocorrem após um longo período de estiagem, a primeira água que precipita das nuvens está mais rica em O-18. Depois de chuvas copiosas, as águas seguintes estão mais ricas em O-16 enquanto o reservatório de onde a água veio por evaporação, por exemplo, um grande lago, estará levemente enriquecido em O-18. Para se ter um elemento de comparação entre amostras de isótopos coletados da natureza, é necessário um padrão de comparação do isótopo do elemento especificado. O padrão mais utilizado para o elemento oxigênio é o SMOW, sigla para o termo inglês Standard Mean Ocean Water, ou Padrão Médio da Água do Oceano. Esse padrão também é usado para o deutério, o isótopo estável pesado do hidrogênio. Existe um parâmetro que mede o desvio isotópico entre o padrão e a amostra analisada. Esse parâmetro é denominado "delta". O que obtém das amostras são razões entre os isótopos menos abundantes e os mais abundantes no denominador do quociente. Assim, para o oxigênio se obtém valores das razões O-17/O-16 e O-18/O-16. A equação para o cálculo do "delta" depende das razões da amostra e das razões do padrão. Amostras empobrecidas nos respectivos isótopos terão valores de "delta" negativos e amostras enriquecidas terão valores positivos.

FÓRMULAS PARA O CÁLCULO DO "DELTA" DOS ISÓTOPOS ESTÁVEIS PESADOS DO CARBONO E DO OXIGÊNIO, AS FÓRMULAS NECESSITAM DE VALORES DE PADRÕES PRÉ-ESTABELECIDOS QUE REPRESENTEM RESERVATÓRIOS ISOTÓPICOS ADEQUADOS.

ESTA TABELA APRESENTA OS PRINCIPAIS PADRÕES PARA OS ISÓTOPOS ESTÁVEIS MAIS UTILIZADOS EM GEOQUÍMICA.

Em processos de cinética química, isótopos pesados são levemente menos reativos do que isótopos leves de um mesmo elemento químico. Por exemplo, o carbono possui dois isótopos estáveis naturais, o mais abundante carbono-12 e o carbono-13. Moléculas biológicas possuem longas histórias de reações bioquímicas complexas e estas reações favorecem a captação maior de átomos de carbono-12 do que de carbono-13. Isto se dá porque a massa do carbono-12 mais leve facilita sua mobilidade e seu modo de vibração mais rápido, vibração térmica intrínseca, favorecendo mais velocidade de interação com outros átomos. As ligações químicas geradas são mais estáveis. O carbono-13 é mais pesado e ocorre o inverso do que acontece com o carbono-12. Sendo assim, amostras de moléculas orgânicas de origem biológicas são mais ricas em carbono-12 do que em carbono-13. Portanto, a biosfera terrestre representa um reservatório geoquímico enriquecido em carbono-12 e empobrecido em carbono-13. Com base nisto é possível saber a origem de uma substância orgânica, se biótica ou abiótica, a partir de sua assinatura isotópica do elemento carbono. O padrão para o carbono é o PDB, sigla para o termo em inglês Pee Dee Belemnite, que é um fóssil de um animal cefalópode (o belemnite) mineralizado com carbonato de cálcio da formação cretácea Pee Dee da Carolina do Sul, EUA. Esse padrão foi escolhido devido à abundância desse material no registro fóssil, a simplicidade da mineralogia, o carbonato de cálcio, e pelo fato de ser uma amostra de origem biológica que sofreu uma transformação diagenética por substituição mineralógica. A razão medida para o elemento carbono é C-13/C-12.

Outro tipo de fracionamento ocorre com isótopos instáveis em que o isótopo pai tem afinidade geoquímica diferente do isótopo filha. Por exemplo, o elemento urânio possui dois principais isótopos naturais, o urânio-238, mais abundante, e o urânio-235, menos abundante. O U-238 decai para chumbo-206 e o U-235 decai para chumbo-207. O urânio é um elemento litófilo, ou seja, tem mais afinidade a se ligar aos minerais silicáticos e na forma de óxidos, mas o chumbo é um elemento calcófilo, ou seja, tem mais afinidade a se ligar ao enxofre formando sulfeto de chumbo. Em uma situação onde uma rocha está inicialmente em processo metamórfico, o urânio decai para chumbo nos minerais desta rocha. Supondo que ela seja submetida a uma fusão parcial, o sistema isotópico é totalmente aberto. Os átomos de urânio e chumbo são liberados no líquido magmático. Se acontecer uma contaminação do magma com material rico em enxofre, por exemplo, se o magma entrar em contato com rochas encaixantes sedimentares evaporíticas contendo gipsita, o enxofre dissolvido no magma capturará efetivamente os íons de chumbo separando-os do líquido magmático em fases sulfetadas que cristalizarão mais rápido. O urânio permanecerá no magma e irá para as fases silicáticas durante a cristalização do magma. O resultado final foi o fracionamento entre os isótopos de urãnio e chumbo, que foram separados devido a terem diferentes afinidades geoquímicas. Assim, rochas sulfetadas terão excesso de chumbo em relação a urânio e rochas silicáticas terão excesso de urânio em relação ao chumbo. Esse processo é denominado de fracionamento isotópico independente da massa, porque o fator considerado na separação entre isótopos relacionados por decaimento radioativo não foi pela massa atômica, mas pela afinidade geoquímica. 

O MINERAL GALENA, SULFETO DE CHUMBO, FRACIONA MUITO BEM OS ISÓTOPOS DE CHUMBO RADIOGÊNICO, MAS NÃO FRACIONA ISÓTOPOS DE URÂNIO DE FORMA EFICIENTE DEVIDO AO URÂNIO SER UM ELEMENTO LITÓFILO.


O mesmo pode acontecer com os isótopos estáveis. No caso do oxigênio, durante o metassomatismo de um mármore, por exemplo, fluidos quentes de origem magmática profunda ricos em sílica dissolvida podem trazer gás carbônico dissolvido na forma de carbonato e bicarbonato e esses ânions estão enriquecidos em C-13. Ao interagir com o mármore parte dos carbonatos de origem biológica na rocha serão substituídos por carbonatos de origem hidrotermal. Esta interação ocorreu devido ao fluido ter maior temperatura e, portanto, maior reatividade substituindo os carbonatos do mármore por minerais calcissilicáticos (devido à presença de sílica dissolvida no fluido) e novos carbonatos de mais alta temperatura poderão substituir a calcita original do mármore. Esse mármore transformado em uma rocha calcissilicática por processo hidrotermal terá fases minerais carbonáticas empobrecidas em C-12 devido à interação hidrotermal. Esse fracionamento isotópico do elemento carbono não foi causado especificamente pela diferença de massa entre os isótopos, mas pela diferença de temperatura e pela interação entre diferentes reservatórios geoquímicos, isto é, mármore de origem sedimentar e fluido hidrotermal de origem magmática profunda.  Os processos geológicos que ocorrem na Terra geraram um trend distinto de isótopos de oxigênio nas rochas terrestres. Este trend é visível no gráfico deltaO-18 versus deltaO-17, onde se observa a chamada Reta de Fracionamento Terrestre. Todas as rochas terrestres (e lunares também) plotam nesta reta. Mas as demais rochas extraterrestres ocupam outros trends nesse gráfico, revelando outros reservatórios geoquímicos no Sistema Solar. Este sistema de isótopos estáveis permite distinguir muito bem materiais terrestres de materiais extraterrestres, como se fossem impressões digitais.

PERFIL GEOLÓGICO SIMPLIFICADO DE UM DEPÓSITO DE SKARN ONDE ROCHAS SEDIMENTARES CALCÁRIAS OU MÁRMORES SÃO SUBMETIDOS À METASSOMATISMO POR AÇÃO DE FLUIDOS HIDROTERMAIS DE ORIGEM PLUTÔNICA. A ASSINATURA ISOTÓPICA DE CARBONO NOS CALCÁRIOS/MÁRMORES É MODIFICADA PELA AÇÃO DE FLUIDOS HIDROTERMAIS QUE PODEM ENRIQUECER AS ROCHAS EM C-13.

O processo de diferenciação tem um significado local em petrologia ígnea e global em planetologia comparada. A diferenciação consiste na evolução de um líquido magmático que cristaliza de forma fracionada extraindo e separando os elementos químicos compatíveis dos incompatíveis. Compatibilidade em geoquímica significa afinidade química com o elemento magnésio. O magnésio é o metal mais abundante nos planetas rochosos, devido aos processos nucleossintéticos favorecerem a sua formação em maiores quantidades. Os elementos químicos cujos íons têm propriedades físicas semelhantes aos íons de magnésio são ditos compatíveis e os demais são incompatíveis. Por exemplo, os íons de Fe2+ têm carga elétrica igual a dos íons Mg2+ e raio iônico semelhante. Portanto, nas rochas o ferro substituirá de forma efetiva sítios cristalográficos que são ocupados pelo magnésio. Outros exemplos de elementos compatíveis são Ni, Cu, Ir, Pt, Mn, Gd, Lu, etc. Já os metais alcalinos possuem raios iônicos maiores que o do magnésio e cargas elétricas menores, sendo assim, esses elementos são incompatíveis. Elementos desse tipo são chamados de LILE (Large Ion Lithophile Elements - elementos litófilos de grande raio iônico) tais como Na, K, Rb, Cs, Sr, Ba, Cl, etc. 

Outra classe de elementos incompatíveis são os HFSE (High Field Strenght Elements - elementos de elevado campo de força) o que significa íons que possuem alta densidade de carga elétrica porque possuem cargas elétricas elevadas com valores +4 e +5 e raios iônicos pequenos, semelhantes ao magnésio ou até menores. Estes elementos são "expulsos" dos sítios cristalográficos do magnésio devido à grande diferença de carga elétrica e a não acomodação de espaço em redes cristalinas por serem muito pequenos. Elementos HFSE são Y, Ta, Zr, Hf, etc. Os elementos incompatíveis estão normalmente associados a fases minerais que cristalizam a temperaturas menores do que os elementos compatíveis que estão associados a fases minerais que cristalizam em maiores temperaturas. Isto se dá também pela relação entre carga e raio iônico dos elementos. Elementos com uma baixa densidade de carga elétrica como os LILE (baixa razão q/r ou seja) são mais suscetíveis a estarem nos líquidos magmáticos durante evento de fusão parcial. Ou seja, serão mais facilmente eliminados dos sítios cristalográficos dos minerais que estão se fundindo. Os elementos compatíveis tenderão a permanecer nas fases sólidas, ou seja, as fases que resistirão mais à fusão com o aumento da temperatura. O que se tem como resultado é um fracionamento geoquímico entre elementos compatíveis que preferem as fases refratárias e os incompatíveis que preferem as fases de baixa temperatura. Assim os minerais de mais alta temperatura como as olivinas e piroxênios fracionarão para si mais os elementos tais como Mg, Fe, Ni, Co, Au, Pt, Cr, W, etc. Já os minerais de mais baixa temperatura de cristalização como muscovita, ortoclásio e plagioclásio sódico fracionarão os elementos Na, K, Rb, Cs, Ta, Zr, etc. 

GRÁFICO DA RELAÇÃO ENTRE RAIO IÔNICO E CARGA IÔNICA DOS PRINCIPAIS ELEMENTOS QUE COMPÕEM AS ROCHAS. A MENOR RAZÃO ENTRE CARGA/RAIO DEFINE OS ELEMENTOS INCOMPATÍVEIS LILE (ÁREA VERDE), A MAIOR RAZÃO DEFINE OS ELEMENTOS HFSE (ÁREA AMARELA), E RAZÕES INTERMEDIÁRIAS DEFINE OS ELEMENTOS COMPATÍVEIS COM O MAGNÉSIO (ÁREA AZUL CLARA).

Análises das rochas terrestres mostram que a Terra possui pelo menos duas regiões internas estratificadas conhecidas por suas diferenças em termos de compatibilidade geoquímica. O manto superior da Terra abrange uma profundidade desde à descontinuidade sísmica de Mohorovic que começa por volta de 30 km de profundidade até 660 km de profundidade numa região de baixa velocidade sísmica anômala chamada de camada D'. O manto superior que está logo abaixo da litosfera é chamado de manto litosférico e é geoquimicamente conhecido como manto empobrecido porque não possui quantidades apreciváveis de elementos incompatíveis devido a estes terem sido totalmente extraídos por eventos magmáticos de fusão dessa região do manto para formar as rochas da crosta terrestre. Xenólitos do manto trazidos por magmas basálticos em hotspots mostram que as rochas do manto empobrecido são principalmente dunitos e peridotitos. Como resultado, as rochas que compõem o manto litosférico são ditas estéreis porque não são facilmente submetidas à fusão parcial e apresentam elevados teores de magnésio. O manto mais profundo, além de 400 km de profundidade, após a zona parcialmente fundida chamada astenosfera, o manto é chamado de manto enriquecido. As rochas oriundas desta região profunda são os kimberlitos e suites magmáticas peralcalinas que incluem carbonatitos e fosforitos. Estas rochas apresentam elevado teor de elementos incompatíveis junto dos elementos compatíveis indicando que não houve extração eficiente dessas regiões profundas do manto (além de 250 km de profundidade), indicando que o manto inferior não foi completamente homogeneizado e fundido por completo, sendo de natureza muito mais metamórfica. O manto inferior é dito fértil porque pode ser fundido por eventos de tectônica profunda gerando magmas ricos em LILE, elementos terras raras leves e elementos compatíveis tais como o magnésio. 

XENÓLITOS DE DUNITO (PORÇÕES VERDES, RICAS EM OLIVINA) EM ROCHA BASÁLTICA. OS DUNITOS SÃO ORIUNDOS DO MANTO LITOSFÉRICO.

Apesar de a Terra não parecer ter sido completamente fundida, a presença de um núcleo de ferro-níquel no planeta demonstra que houve um evento termodinâmico significativo de fusão parcial das rochas que pôde efetivamente fazer a gravidade acumular os metais, anteriormente dispersos, em uma região central do planeta. Esse processo de aquecimento do planeta com formação de crosta, manto e núcleo é chamado de diferenciação planetária. Os corpos do Sistema Solar de forma geral foram aquecidos pelo decaimento radioativo de isótopos de meia-vida curta tais como alumínio-26 e plutônio-244. Corpos maiores como os planetas rochosos foram aquecidos pela energia cinética liberada das colisões e aglutinações de planetesimais menores formando o protoplaneta e depois pelo decaimento radioativo de isótopos de meia-vida curta e meia-vida longa. A Terra fundiu e mantém até hoje seu calor interno graças ao decaimento de isótopos tais como urânio-238, urânio-235, tório-232 e potássio-40. Outros isótopos de meia-vida curta também contribuíram para a fase de aquecimento inicial da Terra o que gerou um grau geotérmico ainda maior na Terra primitiva, tais como os isótopos hoje extintos plutônio-244, plutônio-239 e plutônio-238 e demais elementos actinídeos que estavam presentes no início do Sistema Solar como o berquélio, cúrio e o califórnio. 

RESUMO DOS PRINCIPAIS PROCESSOS DESDE À ACREÇÃO NO DISCO PROTOPLANETÁRIO ATÉ DIFERENCIAÇÃO PLANETÁRIA COMPLETA E OS PRINCIPAIS SISTEMAS ISOTÓPICOS UTILIZADOS PARA DATAR ESTES EVENTOS.

O evento de formação do núcleo da Terra foi muito rápido em termos cósmicos, durando no máximo 10 milhões de anos. Estimativas de idade de formação do núcleo provém de fracionamento do sistema isotópico háfnio-tungstênio. O háfnio-182 é um radionuclídeo extinto que se acumulou de forma homogênea na prototerra antes da formação do núcleo. O háfnio-182 tem meia-vida de 8,9 milhões de anos e decai para o isótopo estável tungstênio-182. O háfnio é um elemento litófilo, isto é, tem maior afinidade geoquímica aos silicatos e óxidos e como tal esse elemento prefere se acumular na crosta terrestre acompanhando os líquidos magmáticos por se comportar mais como um elemento incompatível. Já o tungstênio é um elemento siderófilo, isto é, prefere as fases metálicas nativas de ferro-níquel e como tal é fracionado pelas fases metálicas se separando dos silicatos. No evento de formação do núcleo da Terra grande parte do háfnio-182 decaiu e se transmutou para tungstênio-182. No entanto, o tungstênio-182 foi fracionado pelos metais que foram levados para o centro do planeta formando o núcleo. O resultado final foi o empobrecimento da crosta terrestre em tungstênio-182 indicando que quando o núcleo da Terra se formou muito rapidamente dando tempo de ter levado o háfnio-182 decaído para tungstênio-182 para o núcleo e empobrecendo as rochas silicáticas que hoje compõem a crosta. Demais fracionamentos isotópicos ajudam os geoquímicos a entender melhor os processos planetários e no futuro ajudará a compreender a evolução plena da geologia complexa da Terra e de outros planetas além no futuro distante.

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