Meteoritos Lunares: A Geologia da Lua trazida à Terra junto das Missões Espaciais

 

A TERRA FOTOGRADADA A PARTIR DA ÓRBITA LUNAR.

Um dos impactos cósmicos de maior interesse ocorreu há cerca de 4,5 bilhões de anos quando a Terra já diferenciada foi submetida a uma violenta colisão tangencial com o protoplaneta Theia cujo diâmetro era semelhante ao do planeta Marte de hoje. Como resultado deste evento, material foi lançando para o espaço, que se pensa representar na sua maioria do manto terrestre, e outra parte de Theia. Este material coalesceu e formou a protolua. Modelos de formação da crosta lunar mostram que a Lua após ser acrecionada passou a ter um oceano magmático do qual a partir deste as primeiras rochas anortosíticas cristalizaram e passaram a boiar neste mar de magma, a sequência de cristalização prosseguiu se diferenciando até os dunitos. 

A crosta lunar é originalmente de composição anortosítica, com algumas suítes magmáticas de troctolitos, gabros e noritos. Posteriormente, a Lua foi submetida a bilhões de impactos de asteroides e cometas durante um período de 4,1 Ga a 3,85 Ga conhecido como Bombardeamento Pesado Tardio. Sendo submetida a esta série de bombardeamentos cósmicos, a crosta lunar foi completamente retrabalhada, gerando inúmeras crateras de impacto em um número tão grande delas que muitas se sobreporam ao longo da história de colisões produzindo brechas e regolitos. Impactos gigantes na crosta lunar escavaram crateras tão amplas e profundas que o manto lunar foi fraturado e sofrendo fusão parcial gerou ascensão de líquidos magmáticos que preencheram estas crateras gigantes com derrames basálticos produzindo os mares lunares basálticos sendo naturalmente mais jovens que a crosta anortosítica chamada de terras lunares.

Além de sofrer impactos gigantes, a Lua foi submetida a constantes impactos de milhões de micrometeoroides que lentamente durante bilhões de anos pulverizaram a crosta convertendo-a em uma camada de material fino com dezenas de metros de espessura composta de fragmentos microcristalinos e produtos de impactos anteriores numa mistura mal selecionada denominada de regolito lunar. O regolito lunar é constantemente bombardeado por partículas dos raios cósmicos, principalmente partículas oriundas do vento solar e estas partículas modificam o regolito num processo chamado de intemperismo cósmico (space weathering) implantando gases do vento solar nas partículas do regolito lunar. Quando outros impactos ocorrem no regolito, este sofre cimentação sendo convertido numa massa coerente denominada brecha de regolito lunar. 

Essas brechas são abundantes e contêm a assinatura do intemperismo cósmico em seu conteúdo e representam amostras do regolito lunar, permitindo estudar os componentes do regolito e sua mineralogia, além de permitir saber a concentração de um isótopo muito importante na futura produção de energia nuclear, o He3. As brechas lunares guardam a história dos resets isotópicos que ocorreram devido aos múltiplos impactos na crosta lunar demonstrados pelo método Ar39-Ar40 nos clastos. Quando impactos ocorrem na Lua, pedaços da crosta são lançados para o espaço, muitos deles assumem órbitas geocêntricas e podem ser capturados pela gravidade da Terra entrando na atmosfera a velocidades menores que a de meteoroides asteroidais, chegando à superfície como meteoritos lunares ou lunaítos.

QUANDO UM ASTEROIDE OU COMETA GRANDE O SUFICIENTE ATINGE A CROSTA LUNAR, FRAGMENTOS DA LUA SÃO EJETADOS COM VELOCIDADE SUFICIENTE PARA ESCAPAREM DE SUA INFLUÊNCIA GRAVITACIONAL. ESTES FRAGMENTOS DA LUA AO ENTRAREM NA ATMOSFERA DA TERRA, QUANDO RESISTEM À ABLAÇÃO ATMOSFÉRICA, TORNAM-SE METEORITOS LUNARES.

- Classificação dos Meteoritos Lunares: 

Os meteoritos estão subdivididos segundo duas categorias: os condritos e os não-condritos. Os não-condritos reúnem os acondritos, que são os meteoritos rochosos desprovidos de textura condrítica, os siderólitos, que possuem porções semelhantes de fase metálica e fase silicática e os sideritos, que são meteoritos metálicos de Fe-Ni. Os acondritos são os meteoritos rochosos que não possuem uma textura condrítica, eles são divididos em acondritos primitivos e acondritos diferenciados.

Os acondritos primitovos são restitos de fusão parcial incipiente de materiais originalmente condríticos, preservando as proporções condríticas de elementos litófilos refratários, estes são os chamados de acapodranitos (acapultoitos e lodranitos), winonaitos, brachinitos e ureilitos. Sendo que os brachinitos e os ureilitos apresentam características de acondritos tanto primitivos quanto diferenciados. Os acondritos diferenciados são subdivididos em asteroidais e planetários. Os acondritos diferenciados asteroidais são aqueles meteoritos que representam rochas ígneas oriundas de asteroides diferenciados, estes são representados pelo grupo H.E.D. (Howarditos, Eucritos e Diogenitos) que são oriundos do asteroide 4-Vesta, o maior asteroide do sistema solar que possui um diâmetro médio de 550 km e foi submetido à diferenciação asteroidal possuindo uma crosta com derrames basálticos e um interior diferenciado em manto e núcleo metálico. Também acondritos diferenciados asteroidais são os aubritos e os angritos, ambos sendo também produto de magmatismo em asteroides diferenciados, mas cujos corpos parentais não são o asteroide 4-Vesta.

Os acondritos diferenciados planetários possuem características mineralógicas, texturais, geoquímicas e isotópicas totalmente diferentes da dos acondritos diferenciados asteroidais. Estes possuem uma história geológica muito mais complexa apresentando sucessivas assinaturas de extrações magmáticas e retrabalhamento em regolitos, apresentando teores de gases nobres planetários muito diferentes das do padrão condrítico. Esses meteoritos são representados por dois grupos compostos, os meteoritos S.N.C. (Shergottitos, Nakhlitos e Chassignitos) que foram descobertos serem oriundos do mesmo corpo parental que possui dimensões planetárias para ter uma geologia tão ativa a ponto de gerar rochas basálticas como os Shergottitos com idades tão recentes de até 180 Ma, indicando que o corpo planetário de origem desses meteoritos possuía ou ainda possui uma geologia ativa. 

Teores de gases nobres existentes nestes meteoritos revelou um padrão semelhante aos gases nobres atmosféricos do planeta Marte. Outro dado importante foi a presença de uma assinatura de enriquecimento em deutério em relação ao hidrogênio, também esta semelhante ao padrão isotópico de hidrogênio da atmosfera de Marte. Tudo isso mostra que esse grupo de acondritos são pedaços da crosta de Marte que foram ejetadas por impactos gigantes na superfície de Marte. Outro grupo de meteoritos extremamente complexos são brechas de regolito, brechas fragmentárias, basaltos e gabros com sucessivas histórias de impacto cósmico contendo padrão de resets isotópicos de seus sistemas K-Ar, além de muitos destes possuírem padrão isotópico de oxigênio que plotam na reta de fracionamento terrestre compartilhando padrão de fracionamento isotópico com as rochas terrestres. Esses meteoritos foram comparados com as amostras de rochas lunares trazidas pelas missões Apollo da NASA, revelando-se serem meteoritos lunares, fragmentos há muito ejetados da crosta lunar por impactos cósmicos, estes impactos foram os que produziram os resets isotópicos nesses meteoritos.

O grupo dos lunaítos, portanto, se enquadra na classe dos acondritos diferenciados planetários, estes acondritos possuem uma história de diferenciação e reprocessamento ígneo e/ou metamórfico que não pode ser explicada em um corpo parental simples como um asteroide, mas o corpo parental destes meteoritos são de dimensões planetárias para que pudessem desenvolver rochas com uma geologia mais complexa. Os meteoritos lunares são assim classificados como oriundos da Lua porque seus espécimes foram comparados com as rochas lunares trazidas pelas missões Apollo e Luna. Estas rochas foram analisadas tanto geoquimicamente quanto isotopicamente e provaram ser fragmentos da crosta lunar. A maioria dos meteoritos lunares são brechas anortosíticas ou também denominadas de brechas feldspáticas. Essas brechas são subclassificadas em fragmentárias, de fusão de impacto, de regolito e granulíticas. 

As brechas que representam porções da crosta lunar que não apresentam abundantes fragmentos regolíticos tais como aglomerados, aglomerados vesiculares, esferulitos e fragmentos de FeNi e condríticos são denominadas de brechas fragmentárias, as brechas que apresentam assinaturas de gases do vento solar implantados e os componentes regolíticos supracitados representam o regolito lunar que foi exposto ao vento solar e aos raios cósmicos e, portanto, são denominadas de brechas de regolito, sendo estas a junção mecânica de fragmentos inconsolidados que é cimentado por impactos cósmicos, talvez cimentadas no momento do impacto que as ejeta da Lua. 

As brechas que apresentam clastos sustentados por uma matriz de natureza vítrea ígnea representam fragmentos da crosta lunar que foram cimentados por rocha fundida e vitrificada por impactos cósmicos ou eventos vulcânicos e são denominadas de brechas de fusão de impacto. E as brechas que apresentam texturas de recristalização em sua mineralogia mostrando que estavam soterradas em grande profundidade e submetidas ao calor residual da Lua devido a seu gradiente geotérmico ou devido a impactos gigantes e foram assim parcialmente metamorfisadas adquirindo lamelas de exsolução nos clinopiroxênios, devitrificação de partes da matriz e texturas simplectíticas são denominadas brechas granulíticas. 

CLASSIFICAÇÃO GERAL DAS BRECHAS METEORÍTICAS. Extraído de Krot et al. (2014).

De maneira geral, estas brechas lunares feldspáticas são amostras das terras altas lunares ou highlands que representam a crosta original primitiva da Lua de composição anortosítica, mas esta crosta anortosítica foi retrabalhada, impactada, pulverizada e brechada por bilhões de anos de erosão cósmica, seja por impactos de micrometeoritos, impactos de asteroides e cometas e alteração por raios cósmicos produzindo complexas litologias de brechas diversas. As brechas consistem de clastos angulosos de anortosito, leucogabros, noritos, troctolitos ou mesmo fragmentos de vidro vulcânico, vidros de fusão de impacto, fragmentos de brecha fragmentária, etc, sustentados por uma matriz escura fina cristalina e/ou vítrea geralmente composta por microfragmentos de anortositos, esferulitos, micropartículas de metal e minerais de impacto, além de sílica, cromita titanífera, magnetita e Mg-ilmenita abundante.

FATIA DO METEORITO LUNAR CALCALONG CREEK, UMA BRECHA ANORTOSÍTICA DE REGOLITO.

FATIA DO METEORITO LUNAR NWA 7274, UMA BRECHA FELDSPÁTICA FRAGMENTÁRIA.

Outro tipo de litologia lunar são os basaltos dos mares lunares. Os mares são gigantescas bacias de impacto que foram escavadas por impactos gigantes que produziram fraturamento da crosta lunar e consequente fusão parcial trazendo à superfície magmas basálticos que preencheram estas crateras gigantes gerando extensas planícies de derrames basálticos que são as regiões mais escuras da lua. Alguns destes basaltos possuem uma assinatura geoquímica muito específica da Lua, sendo este padrão geoquímico conhecido como KREEP, um acrônimo para a presença anômala de potássio, elementos terras-raras (REE – Rare Earth Elements) e fósforo associados. 

Esse padrão geoquímico “KREEPy” é correlacionado à região de Oceanus Procellarum identificada com uma anomalia de Th, U e K por sensoriamento remoto lunar. Os basaltos lunares são classificados em pobres em Ti, moderadamente ricos em Ti e ricos em Ti, amostras das missões Apollo representam basaltos com até 11% de Ti. Os basaltos lunares são empobrecidos em elementos voláteis como Na e K em relação aos basaltos terrestres. Alguns meteoritos lunares ocorrem como basaltos brechados, basaltos em contato litológico com brechas de regolito e basaltos associados a brechas de fusão de impacto. 

NESTA FOTOGRAFIA DA LUA, AS REGIÕES BRANCAS SÃO AS TERRAS ALTAS COMPOSTAS DE ROCHAS FELDSPÁTICAS ANORTOSÍTICAS E AS REGIÕES ESCURAS SÃO OS MARES LUNARES COMPOSTOS DE EXTENSOS DERRAMES BASÁLTICOS. AS TERRAS SÃO MAIS ANTIGAS QUE OS MARES LUNARES. CIRCULADO EM VERMELHO ESTÁ A REGIÃO DE OCEANUS PROCELLARUM ONDE EXISTEM ROCHAS VULCÂNICAS COM ANOMALIA GEOQUÍMICA KREEP.

METEORITO LUNAR NWA 4898, UM BASALTO LUNAR, NO CANTO SUPERIOR DIREITO DA SEGUNDA IMAGEM ESTÁ O DETALHE MICROSCÓPICO EVIDENCIANDO A TEXTURA VULCÂNICA DE ACÍCULAS DE PLAGIOCLÁSIO CÁLCICO EM MEIO À MATRIZ ESCURA CRIPTOCRISTALINA DE COMPOSIÇÃO MÁFICA.

DETALHE DE MICROSCÓPIO PETROGRÁFICO COM POLARIZADORES CRUZADOS DO BASALTO LUNAR NWA 4898 MOSTRANDO A TEXTURA VULCÂNICA COM CRISTAIS BRANCOS/CINZAS DE PLAGIOCLÁSIO COM HÁBITOS ACICULARES E CRISTAIS COLORIDOS DE CLINOPIROXÊNIO CÁLCICO, TÍPICA ASSOCIAÇÃO MINERAL DE UMA ROCHA DE COMPOSIÇÃO BASÁLTICA.

Os meteoritos lunares são todos achados, sendo a maioria encontrada nos desertos quentes do Saara, Algeria, Líbia, Marrocos e Omã e na Antártica pelas missões ANSMET da NASA. Estes meteoritos são resultado de ejeção de pedaços da crosta lunar por impactos de asteroides e cometas na Lua que geram projéteis com capacidade para vencer a velocidade de escape do campo gravitacional da Lua. Os meteoroides lunares, isto é, os pedaços ejetados da crosta lunar, possuem um tempo de transição do percurso da Lua até a Terra. 

Datações do tempo de percurso por exposição de raios cósmicos de meteoritos lunares demonstram que estes representam uma população de pedaços ejetados da Lua há pelo menos 20 Ma com um limite inferior de 0,5 Ma. A maioria dos meteoroides lunares quando ejetados assumem órbitas geocêntricas e entram na atmosfera da Terra com velocidades mais baixas do que os meteoritos asteroidais visto que estes últimos são grandemente acelerados pela gravidade do Sol em virtude de terem órbitas heliocêntricas. É possível que alguns meteoritos lunares fossem meteoroides que assumiram órbitas heliocêntricas. A maioria dos meteoritos lunares é menor do que a média de massa para os meteoritos rochosos, principalmente acondritos planetários como os meteoritos marcianos, possuindo médias de 50 g. O primeiro meteorito lunar identificado foi o ALHA 81005 com uma massa de 31 g encontrado na Antártica. O primeiro meteorito lunar achado fora da Antártica foi o Calcalong Creek de 19 g encontrado no deserto da Austrália. Posteriormente, muitos mais começaram a ser achados e identificados como lunares.

METEORITO ALHA81005, O PRIMEIRO METEORITO LUNAR ENCONTRADO. EM COMPARAÇÃO COM AS ROCHAS TRAZIDAS PELOS ASTRONAUTAS SE CONCLUIU SE TRATAR DE UMA ROCHA LUNAR, UMA BRECHA ANORTOSÍTICA DE REGOLITO.

Normalmente os lunaítos apresentam uma crosta de fusão vítrea, às vezes com vesículas e marrom fosca, ou verde oliva com aparência túrbida. Os meteoritos lunares possuem diversas idades que podem ser determinadas por isótopos cosmogênicos, estas idades são as de cristalização da crosta lunar, que normalmente é resetada para sistemas isotópicos frágeis como K-Ar e não há como datar clastos anortosíticos devido ao plagioclásio não fracionar bem elementos radioisotópicos geoquimicamente imóveis como o sistema radiocronológico Sm-Nd ou Re-Os, gerando assim apenas idades de resets isotópicos geralmente interpretadas como idades de impactos cósmicos na Lua, há também o tempo de residência da rocha no regolito lunar dada pela concentração de gases nobres solares implantados nos fragmentos minerais do regolito, depois o tempo de transição Lua-Terra do meteorito quando ejetado da superfície lunar sendo determinado como a idade de exposição cósmica através de isótopos de Ne21 e finalmente a idade terrestre ou idade de residência na Terra dada por isótopos cosmogênicos de Be10, Cl36 e C14.

- Geologia do Regolito Lunar:

Cerca de 0,1% de todos os meteoritos coletados são meteoritos lunares, onde a maioria deles são brechas polimíticas de regolito lunar. Estas rochas contêm importantes informações sobre a mineralogia, composição química e assinatura isotópica do regolito lunar. Este material inconsolidado foi convertido em uma rocha coerente por impactos de asteroides no regolito lunar. O regolito contém uma mineralogia diversa e exótica, além de componentes complexos como esferulitos, aglutinados vesiculares, clastos angulosos da crosta lunar tais como anortositos, gabros, troctolitos, noritos e até fragmentos de basaltos e vidro vulcânico, estes guardam um sistema isotópico que foi aberto em múltiplas colisões sendo possível datar os eventos de reset isotópico através do método Ar39-Ar40. Além desses componentes do regolito, essas amostras de regolito podem conter microfragmentos de outros meteoritos, tais como partículas de FeNi e partículas de condritos, todos estes componentes implantados nos regolitos.

Muitos regolitos lunares contêm proporções variadas de gases implantados dos ventos solares. Esses eram partículas de alta energia ejetadas por fluxos na atmosfera solar. Estas partículas tais como prótons, elétrons, dêuterons e partículas alfa bombardeiam constantemente a Lua e muitas destas ficam aprisionadas no regolito. Um isótopo cosmogênico implantado que é de maior importância aqui é o Hélio-3. Esse componente isotópico do regolito foi medido nos locais de pouso das missões Apollo e os dados revelam que a distribuição da concentração de He3 no regolito lunar não é constante, mas depende de uma série de variáveis inerentes ao tipo de regolito e sua profundidade, por exemplo. O He3 é um importante isótopo que pode ser utilizado no futuro como combustível estável para a fusão. Esse isótopo praticamente não existe na Terra, mas é relativamente abundante na Lua, preso no regolito lunar. No futuro, será possível a humanidade minerar o regolito em busca desse isótopo.

O fato de não testemunharmos quedas de meteoritos lunares significa que a maioria destes representam populações de meteoroides que existiam nas proximidades da Terra há apenas pelo menos milhares de anos atrás, provavelmente não existindo mais meteoroides lunares nas proximidades da Terra, pelo menos não em abundância semelhante a de meteoroides condríticos, vestoides ou mesmo de Marte. Essa informação pode ser extraída sabendo a idade terrestre dos lunaítos.

A idade de residência dos meteoritos lunares na Terra é de muita importância para a ciência meteorítica, porque todos os meteoritos lunares são achados, sendo que, sabendo sua idade terrestre somada a sua idade de exposição cósmica quando estes estavam na fase de meteoroide, o chamado tempo de trânsito da Lua para a Terra, pode-se chegar a idade de ejeção do material lunar a partir de sua crosta por impactos de asteroides e cometas. O tempo de ejeção de meteoritos lunares permite correlacioná-los, isto é, verificar se estes fazem parte do mesmo local de onde foram ejetados, se a cratera de origem deles é a mesma. Se dois meteoritos lunares têm praticamente a mesma idade de ejeção e apresentam a mesma litologia, então é quase certo que estes são pareados, ou seja, são oriundos da mesma cratera de impacto lunar.

De forma simples, o grau de intemperismo dos meteoritos é diretamente proporcional ao seu tempo de residência no ambiente terrestre. Todos os meteoritos lunares coletados até hoje foram achados nos desertos quentes de Omã, Saaara, Líbia e Austrália e no deserto gelado da Antártica. Nos ambientes desérticos os meteoritos rochosos podem sobreviver ao intemperismo por até 50 mil anos ou mesmo até 300 mil anos. Na Antártica foram encontrados meteoritos com idades terrestres superiores a 2 Ma. Nesses ambientes secos e quentes, de natureza árida ou semi-árida, os meteoritos lunares se acumulam e são submetidos a alteração terrestre tais como produção de veios e fraturas preenchidos com caliche, evaporitos ou argilominerais em estágios avançados de intemperismo. 

Tais meteoritos são submetidos a bombardeio dos raios cósmicos quando eram meteoroides no espaço interplanetário. Ao chegarem à superfície, cessa a influência dos raios cósmicos que param de produzir o isótopo no meteorito. Em corpos parentais, ou meteoroides, pequenos como asteroides, por exemplo, a irradiação cósmica ocorre em todas as direções do meteoroide até atingir a saturação em profundidade no meteoroide, esse tipo de bombardeio cósmico de partículas é denominado de irradiação 2π. Quando a superfície do corpo parental é considerada infinita, isto é, não há como as partículas bombardearem toda a extensão em área de um determinado corpo rochoso, mas atuam apenas na superfície até atingir uma certa profundidade de saturação, como é o caso da superfície de corpos planetários como a Lua, o processo é chamado de irradiação 4π. O processo de interação dos átomos da rocha com os raios cósmicos podem ser de captura de partículas com consequente transmutação elementar ou de espalhamento de partículas, isto é, fissões nucleares que geram diferentes isótopos cosmogênicos. As reações nucleares com raios cósmicos, durante saturação, atingem o meteoroide em profundidade gerando em seu interior nêutrons livres que perdem gradualmente a energia convertendo-se em nêutrons térmicos, isto é, de baixa energia, gerando reações nucleares secundárias de captura de nêutrons por nuclídeos específicos.


ESTE GRÁFICO MOSTRA AS IDADES DE EJEÇÃO EM MILHÕES DE ANOS, DOS METEORITOS LUNARES CALCULADAS A PARTIR DO CONTEÚDO DE ISÓTOPOS COSMOGÊNICOS MEDIDOS NAS ROCHAS. A IDADE DE EJEÇÃO CORRESPONDE À IDADE DE EXPOSIÇÃO CÓSMICA SOMADA A IDADE TERRESTRE. NO EIXO VERTICAL ESTÁ A CONCENTRAÇÃO DE TÓRIO INDICANDO QUAIS DESSES MATERIAIS SÃO ORIUNDOS DE EXTRAÇÃO MAGMÁTICA COM ANOMALIA GEOQUÍMICA KREEP, NOTAR QUE O CALCALONG CREEK É UMA MISTURA DE BASALTO COM ANORTOSITO E APRESENTA ALTO TEOR DE TÓRIO INDICANDO SUA ORIGEM NUM DERRAME BASÁLTICO LUNAR IMPACTADO E TRANSFORMADO EM REGOLITO.

A taxa de produção de isótopos cosmogênicos instáveis como C14 é dependente de uma série de variáveis como a profundidade de ação do meteoroide, a área de seção do meteoroide que normalmente produzirá irradiação 2π, o tipo de material, ou seja, se é um meteorito rochoso ou um meteorito metálico, devido ao átomo alvo para produção deste isótopo ser específico, além do que este isótopo possui uma meia-vida muito curta fazendo-se necessário calibrá-lo utilizando a função de produção de outro isótopo instável cosmogênico com uma meia-vida longa, normalmente o Be10. A calibração é feita levando em conta a taxa de produção cosmogênica de ambos os isótopos considerados e sabendo o tipo de meteorito e a profundidade de ação no meteoroide. Faz-se necessário saber a profundidade de ação dos raios cósmicos que está relacionada à taxa de produção dos isótopos cosmogênicos instáveis porque não se sabe de antemão se o meteorito representa um fragmento da superfície do meteoroide ou se este representa um fragmento sobrevivente na entrada atmosférica que fazia parte de uma região mais interna do meteoroide.

Uma vez fazendo estas considerações, o meteorito quando no ambiente terrestre não está mais submetido aos raios cósmicos, então os isótopos cosmogênicos considerados começam a decair. Sabendo a concentração desses isótopos e levando em conta a curva de calibração C14/Be10 para os meteoritos lunares, pode-se calcular o tempo de residência do meteorito, isto é, o tempo desde que parou a produção de radioisótopo cosmogênico. Uma vez que todos os meteoritos submetidos aos raios cósmicos apresentam-se saturados em concentração nos isótopos considerados, quando no ambiente terrestre começam a ter seus isótopos decaindo. Então, se obtivermos as concentrações isotópicas cosmogênicas de um meteorito com idade terrestre conhecida, isto é, um meteorito cuja queda foi testemunhada, então é possível correlacionar seu padrão de isótopos cosmogênicos com as medidas de um meteorito achado de idade terrestre desconhecida, servindo como padrão de calibração isotópica. 

GRÁFICO DAS IDADES TERRESTRES E DE EJEÇÃO DE ALGUNS METEORITOS LUNARES. AS BARRAS DE ERRO GRANDES INDICAM PERDAS DE ISÓTOPOS COSMOGÊNICOS DEVIDO À DEGASEIFICAÇÃO DO REGOLITO LUNAR AO LONGO DO TEMPO E/OU ERROS ANALÍTICOS INERENTES AO MÉTODO UTILIZADO. A MAIORIA DOS METEORITOS POSSUEM IDADES TERRESTRES ELEVADAS, ENTRE 10 MIL A 100 MIL ANOS.

A superfície lunar é coberta por uma camada de material granular fino e inconsolidado chamado de regolito lunar. A espessura do regolito varia de uma média de 5 m nos mares lunares até 10 m nas terras lunares. O principal componente do regolito é um solo de granulação fina de cor cinza com uma densidade em torno de 1,5 g/cm³. No regolito também ocorrem brechas e fragmentos das rochas encaixantes. Cerca de 50% em peso de solo lunar contém grãos que variam em granulometria de 60 a 80 microns.

A Lua não possui atmosfera, portanto, sua camada superior de regolito está exposta a bombardeio de micrometeoritos e irradiação dos ventos solares. O contínuo bombardeio de micrometeoritos no regolito lunar pulveriza cada vez mais fragmentos rochosos e funde porções do solo lunar. As porções fundidas misturadas com fragmentos líticos formam aglomerados irregulares chamados de aglutinantes. Ao mesmo tempo, o vento solar implanta enormes quantidade de H e He e traços de outros elementos. 

CURVA DE DISTRIBUIÇÃO GRANULOMÉTRICA DO REGOLITO LUNAR COLETADO PELAS MISSÕES APOLLO. INDICA-SE UMA MÁXIMA DE GRÃOS MUITO FINOS, COM 90% DAS PARTÍCULAS TENDO TAMANHO MAIOR QUE 10 MÍCRONS.

O contínuo retrabalhamento por impactos de micrometeoritos do solo lunar rico em hidrogênio gera fusão fazendo com que o H aprisionado do vento solar reaja com o FeO presente nas partículas do regolito, produzindo vapor de água e grãos submicroscópicos de Fe nativo onde estes componentes ficam nos aglutinantes gerados. Esse processo continua até que este regolito é soterrado por novas camadas de material ejetado por novos impactos próximos ou são destruídos pela escavação de uma grande cratera. Análises de núcleos de furo de sonda na Lua pelas missões Apollo revelaram uma estratificação rítmica de múltiplos horizontes de regolitos intercalados com material ejetado de impactos.

IMAGEM AO MICROSCÓPIO ÓPTICO DE AGLUTINANTE LUNAR, MATERIAL VÍTREO (PRETO) SOLDA JUNTO PARTÍCULAS MINERAIS E ESFÉRULAS DE FERRO METÁLICO.

A maturidade de um regolito lunar é ditada pelo grau de exposição aos micrometeoritos e ao vento solar. Essa maturidade é verificada pela quantidade de aglutinantes presentes no regolito, distribuição granulométrica e/ou pela quantidade de gases nobres implantados pelo vento solar. No entanto, o meio mais simples de se verificar o grau de maturidade de um regolito é através de determinação magnética da quantidade de grãos de ferro submicroscópicos presentes no regolito.

As raias de material ejetado por impacto vistas nas crateras mais jovens da Lua demonstram que partículas finas podem ser transportadas e depositadas a grandes distâncias na Lua. Vidro e fragmentos líticos são muito importantes porque revelam dados sobre a natureza das rochas existentes longe dos locais de amostragem. Devido a este motivo, os cientistas lunares são interessados na fração grossa-fina do solo lunar. A fração grossa-fina do regolito lunar representa partículas com tamanhos da fração granulométrica da areia. Nesta fração de grãos estão os vidros, fragmentos líticos locais ou exóticos, microbrechas e partículas de aglutinantes.

Os astronautas não encontraram muitas rochas do regolito lunar, sendo a maioria das amostras de regolito um fino pó do solo lunar. A estratégia de amostragem diz que devem ser amostradas rochas das bordas de crateras existentes no regolito lunar, desta forma, as rochas coletadas sob estas circunstâncias representarão amostras do regolito lunar coerente que foi cimentado pelo impacto que escavou a cratera no regolito. Portanto, muitas amostras de mão trazidas pelas missões Apollo 11 e Apollo 15 são brechas de regolito.

UMA PEQUENA CRATERA NA LUA AVISTADA PELOS ASTRONAUTAS, NAS BORDAS ESTA CRATERA CONTÉM BRECHAS DE REGOLITO LUNAR.

No regolito lunar também existe um certo percentual de material piroclástico, apesar de que nenhum vidro vulcânico reconhecido foi encontrado em amostras da Apollo 16, mas uma grande amostragem de vidro vulcânico foi feita pela Apollo 15 e 17. Muitos desses vidros possuem coloração verde e laranja. A missão Apollo 17 foi a que coletou amostras de um solo laranja no regolito lunar, sendo interpretado como produto de erupções vulcânicas na Lua. Os meteoritos lunares que representam brechas de regolito são porções do regolito lunar ejetadas de locais aleatórios na superfície da Lua, devido a impactos de asteroides e cometas. Todos os meteoritos lunares foram submetidos à exposição de raios cósmicos seja durante sua residência no regolito lunar até alguns metros de profundidade ou durante seu trânsito entre a Lua e a Terra. 

Muitos dos meteoritos lunares são brechas de regolito e estes são rochas fragmentárias que contêm o regolito que foi cimentado numa massa coerente, estes naturalmente contêm os componentes do regolito lunar tais como aglutinantes, esférulas de vidro (esferulitos) e produtos de fusão por impacto. Estes meteoritos são amostrados de um número diverso de terrenos geológicos lunares incluindo o lado oculto da Lua e suas regiões polares. Sendo assim, esses meteoritos promovem um relatório mais completo da diversidade global da crosta lunar comparado às amostras das missões Apollo e Luna.

Os acondritos lunares são materiais imprescindíveis no estudo da geologia da Lua. A partir de dados petrológicos gerados pelas análises das rochas lunares trazidas pelas missões Apollo da NASA pôde-se pintar um quadro mais detalhado da história geológica da Lua, mostrando que ela é um satélite natural cuja origem está simbioticamente ligada à origem da Terra, que esta surgiu a partir de material ejetado da prototerra por um impacto tangencial com outro planetoide há 4,55 bilhões de anos. A Lua é um corpo diferenciado em crosta, manto e núcleo. A crosta de composição originalmente anortosítica foi gerada pela cristalização fracionada de um gigantesco oceano de magma basáltico que existia na protolua. A partir desse oceano pedaços de rocha anortosítica cristalizaram e boiaram na superfície, as rochas ultramáficas cristalizaram na base desse oceano permanecendo em profundidade formando o manto lunar. A crosta foi bombardeada durante pelo menos 400 milhões de anos formando todas as inúmeras crateras de impacto vistas através de nossos telescópios. 

As regiões escuras da Lua são eventos magmáticos relativamente recentes (~ 2 - 3 Ga) induzidos por impactos gigantes na crosta lunar. Estes eventos fraturaram a crosta anortosítica e fundiram parcialmente o manto lunar trazendo magmas basálticos à superfície. Os basaltos lunares formaram extensos derrames preenchendo as bacias de impacto. Os meteoritos lunares preenchem as lacunas deixadas pelas amostras coletadas pelos astronautas. Eles consistem de brechas das terras lunares anortosíticas mais antigas e de basaltos dos mares lunares. As brechas indicam idades de resetamento isotópico quando de impactos copiosos na superfície lunar registrando o evento do Bombardeamento Pesado Tardio que foi precisamente datado entre 4,1 Ga e 3,8 Ga através de análises de isótopos radiogênicos dos minerais contidos nas brechas lunares. Muito estudo ainda virá pela frente no futuro onde mais sobre a geologia da Lua será desvendado.

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