Os Vários Estágios na História dos Meteoritos

CONCEPÇÃO ARTÍSTICA DA QUEDA DO METEORITO ALLENDE.

Os meteoritos são rochas que foram submetidas a vários processos naturais antes de chegar às mãos de colecionadores, cientistas ou museólogos. Um meteorito passa por vários estágios ao longo de sua existência, desde a sua formação no seu corpo parental até sua sobrevivência à entrada na atmosfera da Terra e permanência no ambiente terrestre enquanto não é coletado por seres humanos.

Os grupos químicos dos meteoritos são interpretados em meteorítica como diferentes corpos parentais. Os grupos são a mais alta hierarquia de classificação de um meteorito que o identifica, teoricamente, com um determinado corpo parental e isto se aplica de forma similar aos acondritos, não apenas aos condritos. Por exemplo, os condritos ordinários são separados em três grandes grupos químicos: L, LL e H. Estes representam pelo menos três diferentes tipos de corpos parentais de origem desses condritos. O que chamamos aqui de corpos parentais são asteroides, protoplanetas, planetas ou luas de onde os meteoritos vêm, este termo é traduzido da terminologia original em inglês "parent body" que seria traduzido ao pé da letra como corpos pais, mas para clareza e melhor sonoridade escolhi utilizar aqui um "anglicismo" e chamar de corpo parental. No caso dos condritos, eles se originam de asteroides que são resíduos de planetesimais, material acrecionado do disco protoplanetário, um asteroide condrítico de exemplo é o asteroide 25143 Itokawa. Já os acondritos basálticos como os eucritos provêm de um asteroide diferenciado, um "quase" protoplaneta, o asteroide 4 Vesta, que possui 550 km de diâmetro médio. Diz-se então que o corpo parental de um condrito ordinário pode ser o asteroide 25143 Itokawa e o corpo parental de um eucrito é o asteroide 4 Vesta.

Os grupos químicos dos condritos são determinados por três análises realizadas nestes meteoritos: Petrografia (composição mineralógica, texturas de côndrulos, grau de recristalização da matriz, estruturas como fraturas e veios, estimação do tipo petrológico, estágio de choque e grau de alteração terrestre), geoquímica de rocha total e/ou análises pontuais de microssonda eletrônica nas fases minerais determinantes que são as olivinas e os piroxênios e determinação da composição de isótopos estáveis de oxigênio (O16, O17 e O18). Com base nestes dados se determina o grupo do condrito. Os grupos nos acondritos são interpretados de forma diferente, exceto que isótopos de oxigênio também são utilizados para separá-los em grupos. Por exemplo o grupo H.E.D. (Howarditos, Eucritos e Diogenitos) plotam no mesmo campo no gráfico triisotópico de oxigênio, indicando uma mesma origem, um mesmo corpo parental. Eles apresentam similaridades composicionais, os eucritos são basaltos, os howarditos são brechas de regolito asteroidal que contêm clastos de diogenitos e eucritos misturados e os diogenitos são ortopiroxenitos reduzidos, com composição química complementar aos eucritos, seus derivados de fusão. 

GRÁFICO DE ISÓTOPOS ESTÁVEIS DE OXIGÊNIO ONDE PLOTAM OS "DELTAS" DE O17 E O18 EM RELAÇÃO AO O16, EM RELAÇÃO AO PADRÃO ISOTÓPICO DE OXIGÊNIO SMOW (STANDARD MEAN OCEAN WATER), A MÉDIA ISOTÓPICA PADRÃO DA ÁGUA DO OCEANO TERRESTRE. NOTAR QUE OS METEORITOS CAEM EM CAMPOS E RETAS ESPECÍFICAS QUE OS IDENTIFICAM COM SEUS CORPOS PARENTAIS. POR EXEMPLO, AS ROCHAS TERRESTRES E LUNARES TODAS CAEM NA RETA DE FRACIONAMENTO TERRESTRE, QUE IDENTIFICA A TERRA COMO CORPO PARENTAL DESTAS ROCHAS. OS CONDRITOS CARBONÁCEOS E OS UREILITOS PLOTAM NUMA RETA COM INCLINAÇÃO APROX. IGUAL A 1, RETA ESTA QUE IDENTIFICA OS MINERAIS ANIDROS DOS CONDRITOS CARBONÁCEOS (CCAM - CARBONACEOUS CHONDRITE ANHYDROUS MINERALS), INDICANDO ASTEROIDES CARBONÁCEOS COM A FONTE DESSES METEORITOS.

A idade de formação dos condritos, isto é, a idade em que seus componentes foram acrecionados a partir de material do disco protoplanetário: Matriz fina, côndrulos, CAIs e AOAs, é calculada pela quantidade de isótopos radioativos pai e seus isótopos radiogênicos estáveis filho. Por exemplo, o sistema isotópico urânio-chumbo consiste, por exemplo, do isótopo mais abundante urânio-238 que decai em uma série até se transmutar finalmente para o chumbo-206 estável. Diz-se que o urânio-238 é o radioisótopo pai com uma meia-vida de 4,5 bilhões de anos e o chumbo-206 é o isótopo radiogênico estável filho. Sabendo a quantidade de urânio-238 e chumbo-206 em um sistema fechado, por exemplo, em uma amostra de mineral extraído de um meteorito, pode-se calcular a idade de cristalização deste mineral sabendo a constante de decaimento nuclear do urânio-238 que corresponde também a sua meia-vida, uma constante universal e imutável. 

Considerando que a rocha é isotopicamente homogênea, ou seja, toda ela se formou ao mesmo tempo e aprisionou proporções semelhantes de seus isótopos ao longo de seu corpo de minerais, a composição de rocha total também pode fornecer a idade de cristalização da rocha como um todo, a sua idade de formação ou do magma original de seu reservatório geoquímico através da construção de um gráfico de isócrona com várias medidas da rocha total e minerais individuais extraídos da mesma. A isócrona é uma linha reta gerada num gráfico quando normalizamos a concentração dos isótopos na rocha utilizando um isótopo estável não radiogênio como parâmetro de normalização. Por exemplo, se analisamos três diferentes amostras de rocha total de um mesmo meteorito para o sistema isotópico rubídio-estrôncio, onde rubídio-87 radioativo transmuta para estrôncio-87 estável com uma meia-vida de 49,23 bilhões de anos, então cada uma das três medidas vai produzir diferentes concentrações desses isótopos. Mas, medindo as concentrações também do isótopo estável estrôncio-86, que não provém do decaimento do rubídio-87, pode-se obter as razões rubídio-87/estrôncio-86 e estrôncio-87/estrôncio-86 e quando estas razões são plotadas em um gráfico elas caem numa mesma reta chamada isócrona, ou reta de mesma idade. 

ISÓCRONA DO SISTEMA RUBÍDIO-ESTRÔNCIO DO METEORITO MARCIANO NWA 7034 DANDO UMA IDADE DE CRISTALIZAÇÃO DE 2,089 BILHÕES DE ANOS COM A RAZÃO INICIAL Sr87/Sr86 = 0,71359. NOTAR OS PONTOS QUE GERARAM A RETA DA ISÓCRONA, PORÇÕES DIFERENTES DO METEORITO FORAM ANALISADAS E DERAM DIFERENTES RAZÕES, MAS TODAS INDICAM A MESMA ROCHA, PORTANTO SÃO PLOTADAS EM UMA RETA, MOSTRANDO QUE A ROCHA TODA CRISTALIZOU AO MESMO TEMPO.

Outros sistemas isotópicos de elementos químicos geoquimicamente "imóveis", isto é, que dificilmente fracionam em fases distintas quando ocorre diferenciação seja por metamorfismo, fusão parcial e extração de magmas, são utilizados tais como samário-neodímio e rênio-ósmio. Razões isotópicas iniciais de neodímio e ósmio nos meteoritos revelam sua idade de cristalização ou de extração magmática mais antiga em seu corpo parental. Em rochas terrestres estes geram idades modelo, ou seja, a idade em que a rocha foi originalmente "extraída" de um reservatório geoquímico considerado isotopicamente homogêneo. Por exemplo, analisando um basalto de fundo oceânico, sua idade isocrônica determinada pelo sistema rênio-ósmio ou samário-neodímio, revela quando o magma basáltico foi originalmente gerado por fusão parcial do manto superior da Terra. O basalto é a rocha analisada, o manto superior, chamado de manto empobrecido, é o reservatório geoquímico, e a idade calculada é idade modelo do basalto analisado, ou seja, a idade da extração do magma basáltico a partir do manto empobrecido. O manto é dito empobrecido em elementos químicos incompatíveis com o magnésio, ou seja, elementos que preferem as fases fluidas, mais voláteis, como o potássio, sódio, cálcio, nióbio, tântalo, etc. Elementos compatíveis preferem as fases de mais alta temperatura nos minerais ferromagnesianos que são similares em raio iônico e carga iônica ao cátion magnésio, por exemplo, ferro, cromo, platinoides e elementos terras raras pesados como itérbio e lutécio. Analisando o fracionamento desses elementos é possível estabelecer o grau de diferenciação de uma rocha a partir de um padrão, de um referencial geoquímico. O referencial utilizado muitas vezes são os condritos, normalmente os condritos CI, que representam o material mais semelhante à composição da nebulosa solar de onde a Terra e todos os corpos do sistema solar se formaram.

GRÁFICOS "SPIDERGRAM" DE QUATRO DIFERENTES METEORITOS MARCIANOS NO QUE DIZ RESPEITO ÀS SUAS CONCENTRAÇÕES DE ELEMENTOS TERRAS RARAS (OS ELEMENTOS DA SÉRIE DOS LANTANÍDEOS, DO LANTÂNIO AO LUTÉCIO) EM RELAÇÃO AO PADRÃO QUE É A MÉDIA DE COMPOSIÇÃO DOS CONDRITOS CARBONÁCEOS CI. NOTAR O GRAU DE FRACIONAMENTO DESSAS ROCHAS DEVIDO A PROCESSOS DE FUSÃO PARCIAL E CRISTALIZAÇÃO CUMULÁTICA. NOTAR QUE ROCHAS RESULTANTES DE CRISTALIZAÇÃO A PARTIR DE LÍQUIDOS MAGMÁTICOS COMO O METEORITO NAKHLA, APRESENTA EMPOBRECIMENTO NOS TERRAS RARAS PESADOS (DO GADOLÍNIO AO LUTÉCIO), PORQUE ESSES PREFEREM MAIS AS FASES SÓLIDAS DO QUE SEREM FRACIONADOS PARA O LÍQUIDO MAGMÁTICO. JÁ O SHERGOTTITO TISSINT TEM CARACTERÍSTICA CUMULÁTICA, DERIVADA DE ROCHAS DE ALTA TEMPERATURA, RESTITOS DE FUSÃO PARCIAL, OU CRISTALIZAÇÃO A PARTIR DE MAGMA ENRIQUECIDO EM TERRAS RARAS PESADOS. DISCREPÂNCIAS ENTRE TERRAS RARAS LEVES E PESADOS INDICAM UM CORPO PARENTAL DE GEOLOGIA ATIVA COMO ACONTECE NA TERRA E ACONTECEU EM MARTE.

Por exemplo, analisando os elementos químicos traço em um granito em relação à composição elementar dos condritos CI, observamos que os granitos peraluminosos, resultantes de fusão parcial de rochas sedimentares metamorfizadas tais como xistos e quartzitos, são rochas enriquecidas em elementos incompatíveis tais como lítio, césio, flúor, tântalo, ítrio, nióbio, elementos terras raras leves como cério, neodímio e samário e é empobrecida em elementos compatíveis tais como platinoides, magnésio, cromo, elementos terras raras pesados como gadolínio, hólmio, itérbio e lutécio. Esta assinatura geoquímica de elementos traços é típica de rochas de origem planetária, que passaram por múltiplos processos de fusão, metamorfismo, soerguimento e intemperismo, em ciclos de reciclagem de rochas, processos estes que ocorrem em corpos parentais como a Terra onde a geologia é muito ativa com tectônica de placas produzindo vulcanismos, eventos deformacionais, metamorfismo e fusão parcial de rochas pré-existentes. Um meteorito que possui assinatura geoquímica complexa como um granito terrestre representa um fragmento de um corpo que possivelmente tem dimensões planetárias e uma geologia ativa. Meteoritos que possuem padrões simples e similares aos condritos CI são pouco diferenciados e provêm de corpos parentais como uma geologia inativa ou com uma curta história de magmatismos e metamofismo. 

A Lua, por exemplo, não possui indícios de que houve tectônica de placas, é um corpo de massa pequena para desenvolver uma geologia tão ativa quanto à Terra e suas rochas revelam isto. As rochas lunares têm um fracionamento geoquímico menos complexo do que os mais simples basaltos terrestres. Apresentando enriquecimento e empobrecimento em elementos incompatíveis e compatíveis com "desnível" muito pequeno em relação aos condritos CI e em relação a um basalto terrestre. Isto indica que a Lua teve uma geologia ativa por um curto período de tempo, produzindo rochas com pequeno grau de diferenciação, mas depois ela cessou suas atividades, seu núcleo esfriou e a geologia lunar hoje é inativa. Atividade vulcânica na Lua cessou, de acordo com idades de recristalização calculada para rochas lunares trazidas pelas missões Apollo da NASA e para meteoritos lunares, há pelo menos 3,9 bilhões de anos, quando impactos cósmicos de grandes dimensões fraturaram profundamente a crosta lunar gerando fusão parcial de seu manto e ascensão de magmas basálticos.

AMOSTRA APOLLO 10017, BASALTO LUNAR COLETADO PELOS ASTRONAUTAS DA MISSÃO APOLLO 11 DA NASA. ESTE BASALTO REPRESENTA DERRAMES VULCÂNICOS NOS MARES LUNARES, OS EVENTOS GEOLÓGICOS MAIS RECENTES DA LUA.

ISÓCRONAS DOS SISTEMAS ISOTÓPICOS SAMÁRIO-NEODÍMIO E RUBÍDIO-ESTRÔNCIO FORNECENDO A IDADE DE CRISTALIZAÇÃO DO BASALTO LUNAR APOLLO 10017 DE 3,633 BILHÕES DE ANOS E 3,678 BILHÕES DE ANOS, MOSTRANDO CONSISTÊNCIA DE IDADES CALCULADAS. OS ÚLTIMOS EVENTOS VULCÂNICOS NA LUA TÊM IDADES EM TORNO DE 3,7 BILHÕES DE ANOS.

Voltando à questão da isócrona no sistema Rb-Sr a tangente do ângulo de inclinação da isócrona gerada é proporcional à idade da amostra analisada. A isócrona permite uma melhor avaliação de dados de medidas isotópicas obtidos e uma melhor precisão para a idade da rocha como um todo. Além disso a isócrona revela um pouco sobre a natureza de um corpo parental de um meteorito. Por exemplo, plotando a reta isócrona do sistema Rb-Sr, podemos interpolar e calcular a razão isotópica inicial de estrôncio-87/estrôncio-86 e esta razão revela muito sobre a natureza do corpo parental. A menor razão isotópica inicial de Sr87/Sr86 são das CAIs, as inclusões refratárias cálcio-aluminosas, os primeiros aglomerados minerais a condensarem a partir da nebulosa solar, os sólidos mais antigos do sistema solar. Razões isotópicas inicias elevadas indicam o grau de diferenciação geológica de um corpo parental. A razão inicial Sr87/Sr86 dos condritos é menor do que a dos acondritos marcianos que é menor do que os granitos pós-cambrianos da Terra. O grau de diferenciação geológica de um corpo parental dita o quão distante ele está do material original primitivo da nebulosa solar representado pelos CAIs e pelos condritos carbonáceos CI.

A idade da Terra foi calculada desta maneira pelo geoquímico Claire Patterson em 1956 quando ele plotou medidas de isótopos de urânio e chumbo normalizados para o chumbo-204 não radiogênico em uma isócrona. As medidas eram de meteoritos, sedimentos de fundo oceânico e de rochas ígneas terrestres. Todos estes materiais plotavam ao longo de uma mesma reta indicando uma mesma fonte isotópica do urânio-238. Patterson teve a brilhante conclusão de que a idade da Terra era também a idade dos materiais planetários, ou seja, a idade de formação do Sistema Solar. Patterson obteve uma idade isocrônica de 4,55 bilhões de anos, a confirmação definitiva da idade da Terra. A idade de cristalização da maioria dos meteoritos está nesta faixa de 4,5 bilhões de anos, a idade do sistema solar. No entanto, existem meteoritos tais como os acondritos lunares que têm idades de 3,9 bilhões de anos ou mais e os acondritos marcianos tais como os shergottitos que representam magmas que cristalizaram em períodos de tempo mais recentes, com idades de cristalização de 165 a 575 milhões de anos, indicando uma geologia ativa ainda recente para o planeta Marte.

ISÓCRONA DE EVOLUÇÃO ISOTÓPICA DO SISTEMA URÂNIO-CHUMBO DESENVOLVIDA POR CLAIRE PATTERSON EM 1956 PARA CALCULAR A IDADE DE FORMAÇÃO DA TERRA. NOTAR QUE OS METEORITOS METÁLICOS CANYON DIABLO E HENBURY REPRESENTAM A FONTE MAIS PRIMORDIAL DE CHUMBO RADIOGÊNICO E SEDIMENTOS OCEÂNICOS MODERNOS (PONTO AZUL) REPRESENTAM A MÉDIA DO MATERIAL "TOTAL" DA TERRA, TODOS PLOTAM NA RETA DE EVOLUÇÃO ISOTÓPICA DE IDADE IGUAL A 4,55 BILHÕES DE ANOS, A IDADE DO SISTEMA SOLAR.

FRAGMENTO DO METEORITO CANYON DIABLO

FRAGMENTO DO METEORITO HENBURY

- AMBOS OS METEORITOS METÁLICOS CANYON DIABLO E HENBURY FORAM UTILIZADOS POR CLAIRE PATTERSON COMO OS RESERVATÓRIOS GEOQUÍMICOS DE CHUMBO RADIOGÊNICO MAIS ANTIGOS, ELE TEVE O INSIGHT DE QUE OS MATERIAIS PLANETÁRIOS TODOS SE FORMARAM COM A MESMA IDADE, A IDADE DO SISTEMA SOLAR. ELE ANALISOU O TEOR DE CHUMBO NOS NÓDULOS DE TROILITA DOS METEORITOS E OBTEVE O PONTO MAIS BAIXO DA ISÓCRONA, A TROILITA DO CANYON DIABLO É HOJE O PADRÃO ISOTÓPICO PARA O CHUMBO.

Um corpo parental normalmente foi submetido a uma longa história de impactos cósmicos. Muitos asteroides, por exemplo, são fragmentos de protoplanetas que foram estilhaçados em violentos impactos com outros protoplanetas no início do sistema solar. Outros asteroides, como os condríticos, são remanescentes de planetesimais, mas também foram impactados múltiplas vezes e esses impactos podem ficar registrados nos minerais como estruturas de impacto, polimorfos de alta pressão, veios e fraturas de choque, brechas de impacto, veios e bolsões de material silicático ou mesmo metálico fundido, etc. Nos impactos os corpos menores do sistema solar, asteroides e cometas, se separam em múltiplos fragmentos, cada um destes expondo novas superfícies ao espaço e partes do asteroide que antes formavam seu interior podem ser expostas ao espaço através de impactos. Corpos de dimensões planetárias como a Lua e Marte estão repletos de crateras de impacto e pedaços das crostas destes mundos foram ejetados para o espaço interplanetário. Alguns desses pedaços chegam à Terra e caem para se tornarem os raros acondritos lunares e marcianos. Estes fragmentos da crosta destes mundos também têm uma idade de exposição ao vácuo do espaço. 

O tempo em que o corpo parental e/ou meteoroide de um meteorito permaneceu vagando no espaço ou as idades de múltiplas exposições de fragmentos de corpos parentais dos meteoritos podem ser determinadas através da análise de isótopos específicos implantados nos meteoritos. Por exemplo, um meteorito marciano era um pedaço da crosta do planeta. Enquanto este meteorito era uma rocha compondo a crosta marciana ele estava "protegido" dos raios cósmicos oriundos de todas as partes do Universo devido à atmosfera do planeta ou mesmo a rocha estava na subsuperfície, protegida dos raios cósmicos por camadas de rochas e/ou regolito subjacentes. O que seria o regolito? Eles são como os solos, material inconsolidado resultante da fragmentação de rochas através de processos intempéricos. No caso dos regolitos, os processos intempéricos são raios cósmicos e impactos de micrometeoritos. A água no planeta Marte também pode ter tido um papel fundamental em compor o regolito marciano. 

Uma vez que acontece um impacto de meteorito gigante na crosta marciana, a rocha marciana é ejetada para o espaço interplanetário se tornando um meteoroide. Uma vez no espaço a rocha agora está exposta aos raios cósmicos, sendo bombardeada em todas as direções por partículas subatômicas de alta energia oriundas de processos astrofísicos ocorrendo em todo o Universo, inclusive partículas oriundas do vento solar. Como resultado disso, alguns nuclídeos presentes na rocha podem interagir com estas partículas gerando isótopos específicos que servem de assinatura para a presença desses raios cósmicos. O tempo em que o meteoroide ficou exposto aos raios cósmicos é chamado de idade de exposição cósmica. Isótopos resultantes da interação com raios cósmicos são chamados de isótopos cosmogênicos. Alguns dos isótopos cosmogênicos mais utilizados para medir a idade de exposição cósmica de um meteorito são hélio-3, neônio-21, criptônio-81 e argônio-38. Alguns desses isótopos, como o hélio-3 e o argônio-38, são estáveis, e sua quantidade acumulada no meteorito é diretamente proporcional à idade de exposição cósmica do meteorito. Cada isótopo tem um método de análise, obtenção de dados e cálculo da idade, mas todos devem concordar aproximadamente com a idade de exposição cósmica real do meteorito. 

COLISÕES ENTRE ASTEROIDES EXPÕEM REGIÕES INTERNAS DOS MESMOS AOS RAIOS CÓSMICOS, REVELANDO QUANTO TEMPO UM METEOROIDE DERIVADO DE UMA COLISÃO PERMANECEU VAGANDO PELO ESPAÇO INTERPLANETÁRIO.

COLISÕES DE ASTEROIDES E COMETAS CONTRA CORPOS PLANETÁRIOS PODEM EJETAR PEDAÇOS DA CROSTA DE MUNDOS PARA O ESPAÇO, UMA VEZ NO ESPAÇO, FRAGMENTOS DA CROSTA SE TORNAM METEOROIDES EXPOSTOS AOS RAIOS CÓSMICOS. OS METEORITOS MARCIANOS SÃO EXEMPLOS DISSO.

Por exemplo, podemos calcular a idade de exposição cósmica de um meteorito hipotético usando esses quatro isótopos citados e chegarmos a resultados tais como 11,9 Ma, 10,8 Ma, 13 Ma, 12,1 Ma. Esses valores nos mostram que há consistência, precisão, na análise e todos os isótopos medidos concordam que este meteorito, aliás, seu meteoroide original, ficou exposto no espaço por pelo menos 12 milhões de anos. Anteriormente a isto, o meteoroide estava "protegido" dos raios cósmicos no interior de seu corpo parental e foi exposto aos raios cósmicos em eventos colisionais. É possível inferir a partir da idade de exposição cósmica as idades em que ocorreram os últimos eventos colisionais nos corpos parentais dos meteoritos. Por exemplo, um meteorito com cinco diferentes idades de exposição cósmica indica que seu corpo parental teve pelo menos cinco eventos de fragmentação por colisões cósmicas de seu corpo parental, onde novas superfícies de meteoroide ficaram expostas aos raios cósmicos. Por exemplo, um meteorito hipotético tem idades de exposição cósmica de 23 Ma, 50 Ma e 100 Ma, isto significa que seu corpo parental foi fragmentado pelo menos três vezes em três eventos colisionais diferentes onde o mais recente foi há 23 milhões de anos e o mais antigo foi há 100 milhões de anos.

HISTOGRAMAS DE IDADES DE EXPOSIÇÃO CÓSMICA DE DIVERSOS METEORITOS ROCHOSOS, VARIANDO DE 150 MA ATÉ 0,2 MA. POR EXEMPLO, OS EUCRITOS TÊM UM PICO DE IDADE EM 20 MILHÕES DE ANOS, INDICANDO QUE O EVENTO COLISIONAL MAIS IMPORTANTE PARA EJEÇÃO DE PEDAÇOS DA CROSTA DO ASTEROIDE VESTA FOI HÁ 20 MILHÕES DE ANOS. OUTROS EVENTOS COLISIONAIS MENORES OCORRERAM DEPOIS INDICADOS PELAS MENORES FREQUÊNCIAS DE EUCRITOS COM IDADES MAIORES OU MENORES QUE ESTA. NOTAR QUE OS DIOGENITOS E OS HOWARDITOS TÊM PICOS NA MESMA IDADE, INDICANDO UM EVENTO DE IMPACTO GIGANTE EM VESTA NESTA ÉPOCA QUE EJETOU TAMBÉM PEDAÇOS DA CROSTA PROFUNDA DE VESTA REPRESENTANDO OS METEOROIDES DOS DIOGENITOS.

Quando o meteoroide é atraído pelo campo gravitacional da Terra e entra na atmosfera, devido à fricção em alta velocidade com o ar atmosférico, ele começa a aquecer até 3000 ºC se transformando em uma bola incandescente com uma calda de material resultante do desgaste por vaporização da rocha. Neste estágio ele é chamado de meteoro e quando brilham próximos da superfície são chamados de bólidos. Quando o bólido deixa de ser incandescente ele cai com uma velocidade terminal quase em queda livre e se fragmentos sobrevivem ao desgaste da entrada atmosférica temos os meteoritos. Os meteoritos achados podem ter caído há milhares ou mesmo milhões de anos atrás. A idade de permanência do meteorito no ambiente terrestre após sua queda é chamada de idade terrestre. Esta idade pode ser medida através de datação radiogênica do material onde o meteorito está inserido, isto é, se tiver minerais evaporíticos como carbonatos crescendo em volta do meteorito, estes carbonatos podem ser datados por urânio-chumbo ou carbono-14. Meteoritos achados com idades terrestres superiores a milhares de anos são normalmente coletados em regiões onde a taxa de intemperismo químico das rochas é muito baixa tais como desertos quentes como o Saara e gelados como a Antártica.

Além disso, quando o meteorito cai na Terra a atmosfera o protege do bombardeio dos raios cósmicos, com isso, isótopos cosmogênicos radioativos deixam de ser produzidos no meteorito porque ele não recebe mais raios cósmicos, e estes começam a decair para isótopos estáveis. Medindo a quantidade de isótopos estáveis e resíduos de isótopos cosmogênicos originais no meteorito é possível calcular a idade terrestre do mesmo. Isótopos muito utilizados são carbono-14, berílio-10 e cloro-36. Estes isótopos têm meia-vida curta, mas são ideais porque meteoritos dificilmente têm idades terrestres superiores a 500 mil anos, sendo facilmente degradados e oxidados pelo intemperismo físico, químico e biológico da superfície terrestre. Exceto em casos extremos, meteoritos podem estar depositados em rochas sedimentares de milhões de anos. Estes são chamados de meteoritos reliquiares ou meteoritos fósseis e a idade de sua queda é estipulada através da idade das rochas onde eles estão encaixados. Alguns meteoritos encontrados na Antártica têm idades terrestres de milhões de anos por estarem preservados em camadas de gelo em plataformas tectonicamente estáveis no continente antártico. Evidências geológicas coletadas pelos russos na estação Vostok, no centro da Antártica, revelam que as camadas de gelo ali remontam até 14 milhões de anos de deposição de neve compondo as geleiras, e estas camadas podem muito bem conter meteoritos bem preservados. 

TABELA DE IDADES DE EXPOSIÇÃO CÓSMICA E TERRESTRES DE ALGUNS METEORITOS. NOTAR AS IDADES TERRESTRES ELEVADAS DOS METEORITOS QUE 94201 COM 290 MIL ANOS E DHOFAR 019 COM 340 MIL ANOS, ACHADOS NA ANTÁRTICA E NO DESERTO DE OMÃ RESPECTIVAMENTE.

Em síntese, vimos que os meteoritos têm uma longa história começando com sua formação determinada pela sua idade de cristalização e aglutinação a partir de material do disco protoplanetário, sua idade de exposição cósmica, que revela eventos colisionais entre corpos parentais e nos diz por quanto tempo um meteoroide permaneceu no espaço interplanetário antes de chegar à Terra e sua idade terrestre que revela por quanto tempo um meteorito achado permaneceu na Terra depois de sua queda.

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