FATIA DO CONDRITO CARBONÁCEO ALLENDE (CV3) MOSTRANDO AS ESFÉRULAS DE MINERAIS ÍGNEOS, OS CÔNDRULOS E MANCHA BRANCA DO LADO DIREITO É UM CAI, UMA INCLUSÃO REFRATÁRIA CÁLCIO-ALUMINOSA.
Os côndrulos são pequenas esférulas de minerais ultramáficos (olivinas e piroxênios) que foram formadas por processos de fusão e cristalização ígnea no disco protoplanetário. A composição elementar dos côndrulos é semelhante à composição elementar da fotosfera do Sol, indicando que estas gotas de minerais ígneos foram formadas na época anterior à aglutinação dos planetesimais, preservando a composição original da nebulosa solar.
A origem dos côndrulos, no entanto, não é prevista em teorias puramente físicas de formação planetária. A descoberta de que os meteoritos condritos contêm os côndrulos e que estes são partículas minerais tão antigas quanto o Sistema Solar forçou os pesquisadores a criar modelos de formação de côndrulos no disco de acreção protoplanetário. Qual a fonte de calor para produzir os côndrulos? Quanto tempo permaneceram no estado líquido? Qual foi a temperatura de pico e qual a velocidade de resfriamento dos côndrulos? Estas perguntas são feitas pelos cosmoquímicos e meteoriticistas há séculos. Os côndrulos são enigmáticas estruturas cujo modelo de geração destes requer análise profunda dos condritos primitivos, isto é, condritos que não passaram por alteração aquosa de baixa temperatura ou recristalização por metamorfismo termal. Os condritos primitivos preservam a química e composição isotópica original dos côndrulos, permitindo aos pesquisadores analisá-los individualmente.
Datações radiométricas pelo sistema isotópico Pb-Pb em côndrulso de condritos primitivos permitiu chegar ao valor de 3 milhões de anos para o tempo de formação dos côndrulos. Ou seja, os sólidos mais antigos do sistema solar datados por este método de datação absoluta são as inclusões refratárias cálcio-aluminosas, as CAIs; estes sólidos foram os primeiros aglomerados de fases minerais a se condensar a partir da nebulosa solar. De forma concomitante às CAIs e se estendendo pelos primeiros três milhões de anos de história do sistema solar na fase de disco protoplanetário, os côndrulos foram gerados. Os principais reservatórios dos côndrulos são os condritos. O que são os condritos?
Os condritos são meteoritos formados de côndrulos e matriz, eles são os meteoritos que possuem a composição elementar mais semelhante à distribuição elementar da fotosfera solar. Em cosmoquímica a distribuição dos elementos químicos medida na atmosfera solar é chamada de distribuição cósmica dos elementos químicos da tabela periódica e é denominada de SAD (Standard Average Distribution), do inglês, distribuição média padrão. Os condritos possuem a distribuição cosmoquímica semelhante ao SAD. Logo, os condritos são as rochas mais antigas do Sistema Solar. Os condritos são rochas sedimentares geradas pela aglomeração gravitacional de côndrulos e poeira protoplanetária. A poeira processada no disco protoplanetário formou uma massa de minerais criptocristalinos, material silicático e carbonáceo amorfo e vítreo que sustenta os côndrulos, esférulas de olivinas e piroxênios, contendo também fases vítreas quando os côndrulos estão preservados sem metamorfismo ou alteração aquosa em sua rocha parental. O material silicático vítreo protoplanetário contido no interior dos côndrulos nos interstícios dos minerais máficos e contido na matriz dos condritos é denominado de mesostasis. Quando a mesostasis passa por metamorfismo termal no corpo parental dos condritos ela é transformada em plagioclásios sódicos e clinopiroxênio cálcico.
GRÁFICO DE COMPARAÇÃO ENTRE A COMPOSIÇÃO QUÍMICA SOLAR NORMALIZADA PARA O ELEMENTO SILÍCIO E A COMPOSIÇÃO QUÍMICA DOS CONDRITOS CI. OBSERVAR A SIMILARIDADE ENTRE AMBAS AS DISTRIBUIÇÕES ELEMENTARES.
Os condritos foram datados pelo método radiométrico do sistema urânio-chumbo com a idade de 4,55 bilhões de anos. As CAIs foram datadas pelo método chumbo-chumbo em 4,6 bilhões de anos, sendo os sólidos mais antigos, ocorrendo na matriz dos condritos carbonáceos e raramente em alguns condritos ordinários primitivos. Os condritos são separados em classes, os ordinários, carbonáceos, enstatitos, rumurutitos e kakangari. Os condritos ordinários recebem esse nome porque são os mais abundantes dentre todos os meteoritos coletados até hoje. Os condritos ordinários possuem abundância elementar dos elementos litófilos refratários semelhante ao SAD. Os condritos são separados em grupos químicos de acordo com dados de geoquímica de rocha total e de isótopos estáveis de oxigênio. Cada grupo químico é interpretado como um diferente corpo parental de origem desses meteoritos. Assim, os condritos ordinários são separados em três grupos químicos: L, LL e H. Os condritos L possuem entre 5% até 10% de ferro-níquel metálico, os condritos LL possuem menos de 5% de ferro metálico, e baixo teor de ferro total dentre todos os ordinários e os condritos H possuem teores de ferro-níquel entre 15% até 25% (teores em volume da rocha). Os condritos carbonáceos possuem abundância elementar de elementos litófilos refratários e voláteis semelhante ao SAD e possuem razões elementares Ca/Si e Al/Si superior a dos outros condritos, devido à presença de inclusões CAIs, AOAs (Amoeboid Olivine Aggregates) e côndrulos cálcio-aluminosos. Além disso, os condritos carbonáceos possuem a matriz alterada por oxidação de baixa temperatura e fraco metamorfismo termal. Como consequência, a matriz originalmente silicática máfica de alta temperatura foi alterada para magnetita, serpentinas e cloritas. Alguns carbonáceos contêm teores de carbono em massa entre 2% até 5% e água estrutural entre 5% até 20%. Os condritos carbonáceos são separados nos seguintes grupos químicos: CI, CM, CV, CO, CB, CH, CK e CR.
ESQUEMA SIMPLIFICADO DE CLASSIFICAÇÃO DAS TRÊS PRINCIPAIS CLASSES DE CONDRITOS E OS RESPECTIVOS TIPOS PETROLÓGICOS DE CADA GRUPO QUÍMICO.
Os condritos enstatitos são condritos com o mais baixo grau de oxidação de seus minerais. Eles são rochas compostas majoritariamente por ortopiroxênio magnesiano, enstatita, e olivina magnesiana, forsterita. O teor de magnésio dos minerais é muito elevado e o ferro está quase completamente na fase metálica na liga de ferro-níquel. Devido ao ambiente redutor da nebulosa solar em que os corpos parentais dos enstatitos se aglutinaram, minerais exóticos existem nesses meteoritos. Alguns destes minerais são oldhamita, niningerita, alabandita e keilita. Os enstatitos são separados em dois grupos químicos: EL e EH. Os EL são menos abundantes em ferro metálico e mais oxidados e os EH são os mais abundantes em ferro metálico e menos oxidados. Os condritos rumurutitos são brechas de regolito asteroidal oxidados com baixíssimo teor de ferro-níquel e baixo grau metamórfico, possuem semelhança petrográfica com os condritos LL. Os condritos kakangari são um pequeno grupo de condritos anômalos petrograficamente semelhantes aos condritos ordinários e com composição isotópica de oxigênio semelhante aos condritos carbonáceos CV.
TEXTURA DO CONDRITO PRIMITIVO SEMARKONA, TIPO PETROLÓGICO 3, MOSTRANDO A MATRIZ FINA ORIGEM PROTOPLANETÁRIA, MUITAS VEZES SILICATOS CRIPTOCRISTALINOS E AMORFOS PROCESSADOS POR EVENTOS TERMAIS NA FASE PRÉ-PLANETÁRIA E PRESENÇA DE MATÉRIA SILICÁTICA VÍTREA COM ELEMENTOS LITÓFILOS VOLÁTEIS (Na e K) CHAMADA MESOSTASIS. SUSTENTADOS POR ESTA MATRIZ PRIMORDIAL ESTÃO OS CÔNDRULOS, ESFÉRULAS DE SILICATOS MÁFICOS (OLIVINAS E PIROXÊNIOS) GERADOS POR PROCESSO ÍGNEO PROTOPLANETÁRIO.
Todo esse sistema de classificação dos condritos foi aperfeiçoado e compilado por Van Schmus e Wood em 1967. Além da classificação em grupos químicos usando dados de geoquímica total e isótopos estáveis de oxigênio, a classificação petrográfica do grau de alteração termal e aquosa dos condritos foi sintetizada nos tipos petrológicos que são designados por números de 1 até 6. Os condritos de tipo petrológico 1 e 2 são aqueles que possuem alteração aquosa de baixa temperatura, mais característico dos condritos carbonáceos mais primitivos CI e CM. Quando falamos aqui em primitivo no caso desses dois grupos de carbonáceos, estamos nos referindo à semelhança entre a distribuição elementar desses condritos e a distribuição elementar da fotosfera solar, ou SAD na cosmoquímica. Ou seja, representam material primordial pouco fracionado do disco protoplanetário. A alteração aquosa de baixa temperatura é caracterizada pela serpentinização e cloritização dos minerais originais de alta temperatura, olivinas e piroxênios. Oxidação das fases ferro-níquel e troilita para magnetita, ilmenita, pentlandita e pirrotita. Transformação de fases carbonáceas em carbonatos de ferro e magnésio por interação com as fases metálicas e sulfetadas. Também podem aparecer como produto de oxidação e alteração aquosa sulfatos de ferro e fayalita. Esta última sendo uma olivina rica em ferro, gerada por oxidação de baixa temperatura na matriz dos condritos CI e CM. Outra característica do tipo petrológico 1 é a ausência de côndrulos e a matriz de granulação fina e natureza amorfa e criptocristalina apresenta-se brechada cortada por veios de carbonatos e sulfatos, tudo isto produto de alteração de gelo de água fundido no interior dos asteroides parentais desses condritos carbonáceos. O tipo petrológico 2 é caracterizado pela presença esparsa de côndrulos pequenos e parte destes alterados por serpentinização e cloritização. Os tipos 1 e 2, além da presença de água estrutural, presença de carbono na forma de carbonatos, matéria carbonácea amorfa formada de hidrocarbonetos complexos, moléculas orgânicas extraterrestres tais como aminoácidos, bases nitrogenadas, carboidratos e hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, e na forma de grãos pré-solares de grafita, nanodiamantes, carbeto de silício (moissanita) e carbeto de titânio.
TEXTURA EM MICROSCÓPIO PETROGRÁFICO DO CONDRITO MURCHISON (CM2) MOSTRANDO A PREDOMINÂNCIA DE UMA MATRIZ ESCURA, CRIPTOCRISTALINA, AMORFA E COM A MINERALOGIA MODIFICADA POR ALTERAÇÃO AQUOSA DE BAIXA TEMPERATURA EM SEU ASTEROIDE PARENTAL. OBSERVAR ALGUNS PEQUENOS CÔNDRULOS DE OLIVINA PREDOMINANTE.
O tipo petrológico 3 representa os condritos primitivos propriamente ditos, isto é, os condritos que não possuem alteração aquosa de baixa temperatura e nem alteração por recristalização causada por metamorfismo termal no corpo do asteroide parental. O tipo 3 é caracterizado pela textura condrítica original formada pela matriz fina de silicatos amorfos e criptocristalinos, fases vítreas da mesostasis e pelos côndrulos, sustentados por esta matriz primordial, com sua composição química e isotópica original do início do Sistema Solar. Os côndrulos são as esférulas de minerais máficos, compostos essencialmente por olivina, ortopiroxênio, clinopiroxênio pobre em cálcio e mesostasis. Os côndrulos possuem vários tipos de texturas dos minerais, ou seja, a forma como os cristais estão arranjados formando as esférulas e o tamanho desses grãos minerais. Os tipos petrológicos 4 até o 6 representam condritos metamorfizados em grau crescente. O grau de metamorfismo é evidenciado pela substituição da matriz original fina por grandes cristais de olivina, piroxênio e plagioclásio, produzidos pela recristalização em estado sólido. A fonte de calor do metamorfismo e também da alteração aquosa de baixa temperatura foi o decaimento radioativo do isótopo alumínio-26 com uma meia-vida de 700 mil anos. Nos primeiros 16 milhões de anos de história do sistema solar, os asteroides foram transformados pelo calor liberado desse decaimento radioativo. O alumínio-26 é um isótopo extinto, seu nuclídeo filho, o magnésio-26, é o que restou em excesso nos sólidos mais antigos nos condritos, isto é, nas CAIs e nos côndrulos. Este excesso do isótopo radiogênio Mg-26 é explicado em cosmoquímica como sendo relíquia da época de enriquecimento isotópico da nebulosa solar com alumínio-26 gerado em explosões de supernova tipo II, quando uma ou mais estrelas gigantes explodiram próximo da nebulosa solar espalhando para o espaço interestelar isótopos novos de meia-vida curta e o Al-26 foi então incorporado no disco protoplanetário e parcialmente homogeneizado.
PETROGRAFIA DO CONDRITO BARWELL, TIPO PETROLÓGICO 6, MOSTRANDO A AUSÊNCIA DA MATRIZ FINA QUE FOI COMPLETAMENTE RECRISTALIZADA PARA OLIVINA, PIROXÊNIO E PLAGIOCLÁSIO E OS CÔNDRULOS ESTÃO PRATICAMENTE INDISTINGUÍVEIS DA MATRIZ RECRISTALIZADA. É POSSÍVEL VISUALIZAR UM CÔNDRULO COM AS BORDAS RECRISTALIZADAS NA PORÇÃO INFERIOR DIREITA DA IMAGEM. AS PORÇÕES ESCURAS SÃO FERRO-NÍQUEL OPACO À LUZ TRANSMITIDA.
Quando os corpos parentais dos condritos se formaram começou a fase de acreção planetária em que os corpos menores, os chamados planetesimais, começaram a se aglomerar gravitacionalmente em protoplanetas, planetoides e embriões planetários. Cálculos de simulação numérica revelam que nesta fase a taxa de colisões cósmica era elevada e os protoplanetas tinham diâmetros que variavam do tamanho da Lua até o tamanho de Marte. Muitas colisões dilaceraram a maioria dos protoplanetas em pedaços de asteroides errantes. Estes asteroides passaram por metamorfismo termal em razão das múltiplas colisões. Os efeito de colisões nos asteroides e protoplanetas é chamado de choque que modifica a textura e estrutura dos minerais, até mesmo modificando a mineralogia em casos extremos e isto fica registrado nos meteoritos. Os condritos possuem diversos estágios de choque. A classificação de Stoffler et al. (1991) traz à tona uma sistemática de classificação dos estágios de choque desde o S0 (ou ausência virtual de choque) até S6 com total obliteração da rocha original formando brechas de impacto, veios e bolsões de material silicático e metálico fundidos e possível presença de fases minerais de alta pressão como a ringwoodita.
Como citado anteriormente os côndrulos se encontram em diversas texturas internas de seus minerais, e recebem uma sistemática de classificação petrográfica e siglas de abreviação para cada um. Os côndrulos mais abundantes são os de Piroxênio Radial (RP) também chamados de côndrulos de piroxênios excentrorradiais, formado por cristais alongados de ortopiroxênio magnesiano com hábitos de finas agulhas que partem de um centro em comum. E os de Olivina Barrada (BO) chamados em inglês de barred olivine chondrules. Estes côndrulos são compostos praticamente de cristais de olivina magnesiana com hábito esqueletal em bandas separadas por material vítreo intersticial, a mesostasis, rica em sílica, sódio e potássio. Muitas vezes côndrulos BO possuem uma borda fina ou grossa de olivinas envolvendo o hábito esqueletal das olivinas mais internas ao côndrulo. Muitas vezes os côndrulos aparecem fundidos uns com os outros, partidos ao meio, em fragmentos, etc. Tanto os côndrulos RP quanto os BO possuem mesostasis com composição silicática rica em sódio, potássio e cálcio. Côndrulos mais raros, mas igualmente frequentes nos condritos são os POP (Porphyritic Olivine Pyroxene), ou seja, côndrulos porfiríticos de olivina e piroxênio, compostos de cristais euedrais a subedrais ou mesmo arredondados de olivina e piroxênios imersos na mesostasis, PO (Porphyritic Olivine) - olivina porfirítica, cristais de olivina em mesostasis, PP (Porphyritic Pyroxene) - piroxênio porfirítico, cristais de ortopiroxênio e/ou clinopiroxênio pobre em cálcio (clinoenstatita) em mesostasis, GOP (Granular Olivine-Pyroxene) - olivina-piroxênio granular, aglomerado de pequenos grãos de olivina e piroxênio imersos na mesostasis e C - côndrulo criptocristalino, estes não apresentam cristais definidos, tendo aspecto amorfo e pode ter composição de olivina, piroxênio ou intermediário entre os dois. Além destes existem os côndrulos poiquilíticos de olivina-piroxênio, que consistem de um inteiro cristal de ortopiroxênio com inclusões de olivinas. Cada uma destas texturas indica um modo de cristalização e resfriamento dessas bolinhas de material ígneo silicático. Os côndrulos preservados todos têm a parte vítrea chamada de mesostasis. Em condritos metamorfizados, os côndrulos tiveram sua mesostasis recristalizada para fases de equilíbrio entre plagioclásios e clinopiroxênio cálcico, especificamente uma paragênese de oligoclásio-diopsídio.
TEXTURAS DE CÔNDRULOS:
CÔNDRULO DE PIROXÊNIO RADIAL (RP), QUANDO O ESTÁGIO DO MICROSCÓPIO É GIRADO OCORRE ESTE EFEITO DE EXTINÇÃO DE CADA CRISTAL INDIVIDUAL DE ORTOPIROXÊNIO COM HÁBITO ACICULAR.
CÔNDRULO DE OLIVINA BARRADA (BO), NOTAR COMO OS CRISTAIS DE OLIVINA FORMAM HÁBITOS EM BASTÕES INTERCONECTADOS E NOTAR A BORDA ÍGNEA DE OLIVINA ENVOLVENDO O CÔNDRULO.
CÔNDRULO PORFIRÍTICO DE OLIVINA-PIROXÊNIO (POP)
CÔNDRULO CRIPTOCRISTALINO, (C), NOTAR AUSÊNCIA DE ESTRUTURA VISÍVEL, ESTE CÔNDRULO NA VERDADE É COMPOSTO DE DOIS CÔNDRULOS UNIDOS.
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